2003-10-10

A IMPORTÂNCIA DO IDE
Por Natália Barbosa

A captação de investimento directo estrangeiro (IDE) tem sido assumida como um importante objectivo económico em virtude da esperada capacidade de estimular o crescimento da economia.

Para além dos ganhos decorrente da entrada de capitais e criação de emprego (caso o IDE se concretize na criação de novas unidades produtivas), o IDE pode gerar benefícios sob a forma de transferência de tecnologia e qualificação da mão-de-obra. Complementarmente, em mercados pouco competitivos, a presença de multinacionais pode aumentar o grau de concorrência e estimular a difusão tecnológica. Benefícios substanciais para a economia acolhedora podem ainda resultar da criação de ligações à estrutura produtiva local através de subcontratação ou outro tipo de relacionamento empresarial que proporcione a difusão tecnológica e o crescimento e modernização das empresas locais.

Todos estes ganhos são desejáveis e nem todos são possíveis de obter com investimento nacional. IDE e investimento nacional não são efectivamente substitutos perfeitos. A questão é que nem todo o IDE produz os efeitos desejados. Desde logo, a estrutura de capitais das empresas com participação estrangeira bem como o papel estratégico das filiais poderão limitar os benefícios económicos daí decorrentes.

Estudos recentes revelam que o desenvolvimento de redes de fornecedores locais é significativamente potenciado quando as multinacionais elegem o mercado nacional como o mercado alvo, quando entram pela via de aquisições e fusões, quando usam tecnologias maduras e desenvolvem operações estandardizadas. Seguindo esta lista percebe-se que os efeitos económicos do IDE em Portugal podem ser de reduzida magnitude.

As multinacionais que têm escolhido Portugal como país de acolhimento têm, em grande parte, uma orientação exportadora, sendo pouco relevante o ambiente competitivo do mercado nacional. Os investimentos mais significativos concretizam-se com a criação de novas unidades produtivas. Grande parte das filiais portuguesas não desempenha papel relevante nas actividades de investigação e desenvolvimento, pelo que a transferência e difusão tecnológica pode estar em risco.

A magnitude e relevância dos efeitos do IDE dependem ainda da intensidade com que as multinacionais estabelecem parcerias com empresas locais. No início da década de 90, cerca de 50% das multinacionais a operar em Portugal detêm mais de 95% do capital das suas filiais, enquanto que 26% estabelecem parcerias com posições minoritárias. Isto revela que embora possam existir condições favoráveis para a transferência de tecnologia, pois esta depende positivamente do grau de controlo detido pela multinacional, a detenção a 100% (ou muito próximo) de grande parte das filiais portuguesas visa minimizar essa potencial difusão tecnológica e absorver a totalidade dos ganhos económicos gerados.

Por outro lado, a desejada melhoria da qualificação da mão-de-obra, quer pela via da formação nas multinacionais ou pelo efeito de demonstração que pode exercer nas empresas locais, requer investimento nacional. Para que a melhoria das qualificações seja transversal é necessário que a mobilidade de trabalhadores entre empresas tecnologicamente mais avançadas e qualificadas, presumivelmente multinacionais, e empresas locais seja exequível. Isto implica que o investimento nacional deverá acompanhar o investimento estrangeiro e inovadoras formas de relacionamento empresarial entre multinacionais e empresas locais deverão ser criadas de forma a ampliar os efeitos positivos do IDE.

A não verificação destas condições torna o IDE não distintamente relevante, devendo ser criados incentivos para captar investimento com valor acrescentado independentemente da sua nacionalidade. Obviamente que a disponibilidade de capital estrangeiro para investimento produtivo é incomparavelmente superior à disponibilidade de capital nacional. No entanto, esta diferença de grandeza não confere vantagens incondicionais.

Referência original: Barbosa, Natália (2003), "A Importância do IDE", Jornal de Notícias (7 de Outubro), p. 16 (colaboração com a Ordem dos Economistas).
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