2007-10-19

EmpreenLer

Zoológico televisivo
Por Pedro Chagas Freitas

Gosto de ver televisão de qualidade. Ainda assim, observo, aqui e ali, a programação da TVI. Afortunadamente, no entanto, basta-me descarregar o autoclismo para deixar de a ver.

Com o programa “A Bela e o Mestre”, a estação de Queluz deu um passo no sentido correcto. Foi uma espécie de Grito do Ipiranga – mas sem Ipiranga (a propósito: que gente é esta que coloca o nome de Ipiranga a um rio?). No fundo, com a colocação no ar deste programa, a TVI deixou uma mensagem implícita a todo o país: “é tempo de mudar. Só é pena não sabermos como. E por isso oferecemos mais do mesmo. Ou melhor: pior do mesmo.” Sim, admito que é perfeitamente inverosímil que este tipo de pensamento tenha sido efectuado pela própria TVI. Desde logo por uma razão muito simples: as estações televisivas, fica agora o nobre e ingénuo leitor a saber, não pensam. Por outro lado, o facto de o pensamento entabulado não conter qualquer erro ortográfico elimina qualquer hipótese de que possa ter sido pensado pela TVI. Basta ler com atenção – ou até com desatenção – as mensagens escritas que passam no fundo do ecrã durante os telejornais para o comprovar.

Mas o que mais me fascinava em “A Bela e o Mestre” era a total incapacidade mental dos seus intervenientes para conseguir arvorar um discurso minimamente coerente e com – por mais pequeno que fosse – sentido. E isto só para falar no júri.

Relativamente aos concorrentes, é fundamental parabenizar, com toda a sinceridade, a produção e, sobretudo, o casting inerentes ao programa. Conseguir reunir tamanha cambada de gente no limiar do analfabetismo primário é, de facto, um mérito assinalável. Só comparável, de resto, ao daquele que é conseguido, quase diariamente, pelo Presidente da Assembleia da República.

E já que me refiro ao tema, aproveito para deixar um repto a quem de direito: por que não fiscalizar, convenientemente, a qualidade da programação televisiva em Portugal? É esta a questão que deixo, em nota de rodapé, às autoridades competentes. E, já agora, também ao Governo.

Pedro Chagas Freitas, co-autor da coluna EmpreenLer, escreve. Há alturas, porém, em que consegue arranjar tempo para viver. Felizmente para o bem-estar de quem o rodeia, esses momentos são cada vez mais raros. Mais informações em www.pedrochagasfreitas.pt.vu
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