2008-05-06

Afinal, por onde andam os vampiros?

Chegou mensagem por correio electrónico que levanta perplexidade. Intitulada "Os Vampiros do Século XXI", afirma o seguinte:

«A Caixa Geral de Depósitos (CGD) está a enviar aos seus clientes mais modestos uma circular que deveria fazer corar de vergonha os administradores - principescamente pagos - daquela instituição bancária. A carta da CGD começa, como mandam as boas regras de marketing, por reafirmar o empenho do Banco em oferecer aos seus clientes as melhores condições de preço/qualidade em toda a gama de prestação de serviços, incluindo no que respeita a despesas de manutenção nas contas à ordem. As palavras de circunstância não chegam sequer a suscitar qualquer tipo de ilusões, dado que após novo parágrafo sobre racionalização e eficiência da gestão de contas, o estimado/a cliente é confrontado com a informação de que, para continuar a usufruir da isenção da comissão de despesas demanutenção, terá de ter em cada trimestre um saldo médio superior a EUR1000, ter crédito de vencimento ou ter aplicações financeiras associadas à respectiva conta. Ora sucede que muitas contas da CGD, designadamente de pensionistas e reformados, são abertas por imposição legal. É o caso de um reformado por invalidez e quase septuagenário, que sobrevive com uma pensão de EUR243,45 - que para ter direito ao piedoso subsídio diário de EUR 7,57 (sete euros e cinquenta e sete cêntimos!) foi forçado a abrir conta na CGD por determinação expressa da Segurança Social para receber a reforma. Como se compreende, casos como este - e muitos são os portugueses que vivem abaixo ou no limiar da pobreza - não podem, de todo, preencher os requisitos impostos pela CGD e tão pouco dar-se ao luxo de pagar despesas de manutenção de uma conta que foram constrangidos a abrir para acolher a sua miséria. O mais escandaloso é que seja justamente uma instituição bancária que ano após ano apresenta lucros fabulosos e que aposenta os seus administradores, mesmo quando efémeros, com «obscenas» pensões (para citar Bagão Félix), a vir exigir a quem mal consegue sobreviver que contribua para engordar os seus lautos proventos. É sem dúvida uma situação ridícula e vergonhosa, como lhe chama o nosso leitor, mas as palavras sabem a pouco quando se trata de denunciar tamanha indignidade. Esta é a face brutal do capitalismo selvagem que nos servem sob a capa da democracia, em que até a esmola paga taxa. Sem respeito pela dignidade humana e sem qualquer resquício de decência, com o único objectivo de acumular mais e mais lucros, eis os administradores de sucesso. Medita e divulga. Mas divulga mesmo por favor.»

À parte o facto deste tipo de debates chegar a Portugal com alguns anos de atraso em relação a outros países e aqui cair geralmente no esquecimento ou no debate de pacotilha, a perplexidade maior resulta não tanto dos argumentos avançados pelo autor da mensagem, mas pelo facto de estarmos perante um banco estatal, por sinal o maior do sector em Portugal, com actividade "sui generis". De facto, se elencarmos as operações financeiras e decisões empresariais tomadas pela CGD, situações como as pensões "obscenas" ou ordenados "principescos" dos administradores não passam de meros "peanuts". São, pois, amendoins que desviam a atenção das operações e negócios em que a CGD anda metida. Daí que exemplos como os apontados reforcem a necessidade de privatização da CGD. Ao Estado deve caber-lhe o exercício da regulação do negócio bancário e não a sua execução. E se o fizer devidamente deve precaver normas que limitem a qualquer operador comportamentos como o descrito, tão mais lamentáveis numa época em que a responsabilidade social das empresas anda na boca de tantos gestores (e até académicos). Ora, se o Estado veste em simultâneo a camisola de regulador e operador, como haverá de ter condições para regular?

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