A comunicação social está a informar que a Autoridade da Concorrência concluiu que não há cartelização no mercado dos combustíveis em Portugal. E, efectivamente, a conclusão é tecnicamente correcta, embora claramente insatisfatória. Isto porque se a comunicação social fosse ligeiramente (só ligeiramente) mais inquisitiva, poderia concluir que, embora não havendo cartelização, possa, ainda assim, haver conluio entre operadores. O que, numa óptica do consumidor e da política de concorrência, é praticamente o mesmo que cartel. Isso se poderia depreender, por exemplo, da notícia do Correio da Manhã de hoje:
«[...]"Não encontrámos indícios de que tenha havido qualquer entendimento ilícito entre dois ou mais operadores do sector e não encontrámos porque a informação está disponível e todos sabem os preços de cada um e os preços internacionais", justificou Manuel Sebastião, garantindo que a AdC procurou identificar comportamentos ilícitos, "mas não conseguiu". De acordo com as palavras usadas pelo presidente da AdC, "num mercado em que os preços nacionais antes de impostos são fortemente determinados pelos preços internacionais e uma vez que todos conhecem o que os outros fazem, os operadores tendem a adoptar um paralelismo de comportamento".»
Ou seja, não há cartel mas, há uma curiosidade chamada "paralelismo de comportamento", o que é evidentemente um claro sinal de conluio. Mas se, mesmo assim persistissem dúvidas sobre os sinais evidentes de conluio desfavorável ao consumidor, prova-o, por exemplo, as intenções governamentais, também elas enunciadas hoje, em desencadear medidas para aumentar a concorrência entre operadores que protejam os consumidores. Mas, afinal, se o mercado funciona, porquê a necessidade destas medidas? Voltarei ao assunto para explicar porque, embora a Autoridade da Concorrência esteja tecnicamente correcta, está, na substância, errada.
P.S.: uma das medidas enunciadas hoje pelo ministro da economia - sim, ele mesmo -, a da colocação de painéis informativos nas auto-estradas com o preço dos combustíveis, tinha sido tornada pública há mais de dois anos. Não tendo sido implementada, só pode concluir-se que o próprio Governo faz parte do mesmo conluio que envolve as grandes gasolineiras e as concessionárias de auto-estradas. E nem sequer nos referimos ao oportunismo fiscal.