2010-12-29

Parque das Caldas

Portagens na auto-estrada
Por Vasco Eiriz de Sousa

Qualquer consumidor racional considera o preço das portagens nas auto-estradas com portagem demasiado elevado. Se, contudo, viajar pela A1 numa sexta-feira à tarde, talvez o congestionamento da via o leve a concluir que o preço das portagens está demasiado baixo.

Por outro lado, uma concessionária de auto-estradas julga que as portagens não estão caras. Se, contudo, se apurar o preço médio das portagens em relação ao rendimento e se comparar esse indicador com outros países, constatasse que o preço praticado é demasiado alto, à semelhança, por exemplo, do que sucede com os combustíveis.

Afinal, em que ficamos? As portagens praticadas em Portugal são caras ou baratas? Esta é uma questão fundamental que deveria ter uma resposta inequívoca para orientar decisões de política pública e definição de preços. Há, no entanto, outras questões não menos interessantes sobre a política de preços nas auto-estradas.

Faz sentido que o Estado continue a ter o seu papel neste mercado, quiçá até de uma forma mais exigente, não só em termos de mediação de preços, mas também noutras características da oferta do serviço. A prova disso é, por exemplo, os inúmeros protestos de grupos de utilizadores a propor a redução ou suspensão das portagens em troços em obras. Na mediação com concessionárias, O Estado pode ainda ponderar decisões de preço que favoreçam o fim público das auto-estradas sem que se prejudique a sustentabilidade económica de cada via.

De forma elementar, as decisões de preço podem basear-se em três critérios (custos, clientes, concorrentes), sendo possível ponderar cada um deles e introduzir alguns mecanismos simples de regulação da procura.

O critério da concorrência neste mercado tem, em Portugal, particularidades que justificam discuti-lo noutra oportunidade, mas os outros dois critérios merecem uma breve reflexão.

Por exemplo, ao diferenciar o preço das portagens consoante a categoria do veículo que as utiliza, o princípio subjacente é o do custo. Neste caso, admite-se, por exemplo, que um veículo pesado gera um maior desgaste da auto-estrada do que um veículo ligeiro. Daí que pague mais. É, aliás, com base neste argumento que se sustenta a ideia de que os motociclistas deveriam pagar portagens mais baixas do que os veículos de quatro rodas, não só porque os custos do serviço para a concessionária são inferiores mas também porque a lotação das viaturas provoca benefícios diferentes para os clientes. Mas, assim não é!

Poderia também fazer sentido diferenciar os preços em função de outras características associadas ao perfil da procura. Não poderiam as portagens ser mais baratas, por exemplo, em períodos de menor utilização e mais caras nos momentos de maior procura, sendo assim o preço de um mesmo troço distinto consoante a hora ou dia de utilização? Não resultaria daqui um maior benefício colectivo, por exemplo, em termos de tráfego e segurança?

Estas medidas de diferenciação parecem, de facto, mais justas do que a simples discriminação entre vias sem custos directos para o utilizador (SCUTs) e vias com portagem. Parecem também mais justas do que outras medidas que apontam, por exemplo, para a discriminação de preço entre residentes na região e forasteiros.

Admite-se que algumas destas ideias sejam difíceis de implementar, mas se as concessionárias até diferenciam o preço de um mesmo veículo consoante utilize via verde ou não (esta anormalidade verifica-se em vários modelos de viaturas), então talvez haja capacidade de implementar soluções mais inteligentes.

Concluindo, talvez se possam ponderar estruturas de preço menos elementares do que as existentes. Não abdicando do princípio do utilizador-pagador, é possível introduzir outros critérios de diferenciação de preço sem, contudo, tornar as estruturas de preço de tal forma complexas que deixem o cliente sem perceber o que está a pagar.

Vasco Eiriz de Sousa é editor do blogue Empreender. Parque das Caldas é uma coluna sobre temas locais.
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